Não havia nenhum raio de Sol no céu. As estrelas ainda eram supremas.
Os olhos amendoados e belos abriram-se, entorpecidos pelo sono. Hoje era dia de partir.
Levantou-se da esteira, sua mãe já havia acordado, preparara para ela um leite grosso, mingau. Mingau que só a mãe sabia fazer.
As mudas de roupa numa malinha improvisada, vestira sua roupa mais bonita.
Lá fora, as folhas choravam orvalho matinal. A aldeia choraria de saudade.
Lavou o rosto com água gelada. Arrepiou toda.
Agora os primeiros raios de Sol surgiam na pequena aldeia.
Os irmãos foram acordando, um a um, e ao verem Tizah tão bonita, e com a malinha ao lado, fizeram-se cabisbaixos.
A filha mais velha do casal Kalua e Tao Zedong, desde pequena sempre estudara muito. Os livros oferecidos pelo guia espiritual da aldeia, Lao Tsing, fizeram-na ganhar gosto pela leitura. Na escolinha da aldeia era a primeira aluna. E por ser autodidata aprendeu a falar inglês com uma facilidade impar.
Certa feita, um casal de ingleses que visitava a aldeia, conheceu a menina Tizah, que se fez de guia para o tão simpático casal. Ele era diretor de uma escola na Inglaterra, e sua esposa, pedagoga renomada. Fizeram o convite aos pais de Tizah. Dariam uma bolsa de estudos integral a menina. Ela moraria no colégio assim como as demais alunas. Estudaria e se desejasse voltaria para a aldeia duas vezes por ano, durante as férias.
Os pais aceitaram, posto que sabiam que Tizah não teria o futuro que gostaria na aldeia.
- Mama, onde está papa?
- Saiu cedo, foi falar com mestre Lao.
Tizah sabia que o pai estava sofrendo sua partida. No âmago ele não queria que ela fosse, saísse da proteção de seus braços paternos, mas Tizah crescera, já tinha quase dezoito anos, era preciso abrir as asas para o mundo!
O dia já se fazia belo, Tizah, antes de partir fora se despedir de mestre Lao.
Ela era a " flor de luz" da aldeia, segundo mestre Lao. A menina era doce e gentil. Sempre cozia batatas para mestre Lao, posto que ele não comia quase nada. Levava chás para ele, passava tarde lendo e conversando com o mestre. Ele que incitara nela o espírito do conhecimento, e Tizah era grata a ele do fundo de seu coração.
Chegou no pequeno templo, tirou os sapatos. Mestre Lao estava sentado, esperando por ela.
- Sente-se menina Tizah.
Tizah beijou-lhe as mãos. Mãos essas cheias de rugas do tempo, envelhecidas pela vida, rudes, porém macias, e cheias de boas ações em cada uma de suas linhas.
- Hoje vais partir.
- Sim, mestre.
- E por que vais?
- Sinto que um pedaço de meu coração me chama naquela terra distante.
- Certo está o teu coração! Vai em busca da metade dele, mas jamais deixe que a metade que tens ai, se perca de ti!
Os olhos de Tizah estavam cheios de lágrimas.
- É difícil deixá-los!
- Não vai deixar-nos, vai só em busca do que te falta! E vai com Deus, ele há de te proteger, menina! Estaremos contigo, onde quer que vá. Deixe que o coração e a intuição te guiem. Não te aflijas, oraremos por seu caminho!
Tizah abraçou o mestre, e chorou.
Os olhos envelhecidos do mestre estavam cheios de lágrimas.
- Vai flor de luz, vai iluminar aqueles que precisam da tua luz!
Tizah deixou o mestre Lao com lágrimas nos olhos.
Ao voltar para a casa a carroça já a esperava.
Sua mãe e seu pai iriam com ela até a estação de trem.
Abraçou todos os irmãos. Eles choravam.
Mukum, o mais novo, ainda um bebê, chorava sem saber porque.
Iriam sentir falta de Tizah, muita falta!
Todos da aldeia apareceram para despedir-se e desejar boa sorte para a flor de luz!
Logo Tizah subiu na carroça, e ao trotar do cavalo, via todos aqueles que amava, ficando cada vez mais longe de suas mãos, mas cada vez mais nítidos em seu coração.
E ao passo que a estrada a afastava da pequenina aldeia, a aproximava de um futuro belo, um futuro promissor que lhe daria suporte para voltar e melhorar as condições de vida daquele povo. Mas primeiro era preciso aprender o necessário para si, e Tizah teria muito o que aprender...
16 de novembro de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Gabi, sempre a escrever e descrever imaginações lindas...A menina Tizah entregue a descoberta de um novo mundo, completamente distante do seu...Todos nós passamos por esta transformação, se não fosse isso não evoluiríamos...mais um belo texto...gostei imenso.
ResponderExcluir